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Artigo

24 de junho de 2024

O PL sobre o uso de Inteligência Artificial e o controle antitruste: o que está por vir?

Na continuação de nossa série sobre concorrência e regulação de mercados digitais e de inteligência artificial, analisamos os últimos destaques envolvendo as duas propostas de substitutivo apresentadas pelo senador Eduardo Gomes (PL-TO) no âmbito do Projeto de Lei nº 2.338/2023 (“PL”), para a regulação do uso de Inteligência Artificial.

O projeto propõe a criação do Sistema Nacional de Regulação e Governança de Inteligência Artificial (SIA), do qual fará parte o CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica (artigo 40, inciso II, alínea “c”). De forma geral, o SIA será um “ecossistema regulatório”, coordenado pelo Poder Executivo e formado por agências e órgãos reguladores setoriais e de autorregulação para a implementação e fiscalização do cumprimento da Lei sobre o uso da Inteligência Artificial.

Foram apresentadas diversas contribuições à primeira proposta de substitutivo, por autoridades diretamente envolvidas na regulação proposta, como ANATEL, ANPD e CADE, e entidades acadêmicas e associações setoriais (IBRAC, IDEC, Lawgorithm, ITI, ABIMED, CNPq, FEBRABAN e outros).

As contribuições do CADE buscam, principalmente, a inclusão de mecanismos de colaboração entre as autoridades integrantes do SIA, garantindo maior segurança jurídica para a atuação conjunta. Dentre os exemplos de cooperação citados pelo CADE, destacamos:

  1. a colaboração das outras autoridades do SIA com o CADE caso detectem possíveis infrações à ordem econômica;
  2. a prerrogativa de o CADE de solicitar às demais autoridades do SIA subsídios técnicos para a análise de atos de concentração que envolvam o uso de inteligência artificial ou para a instrução de processos administrativos de fatos investigados conjuntamente pelas entidades do SIA;
  3. investigações conjuntas entre as entidades reguladoras do SIA sobre sistemas de IA de alto risco, a fim de evitar comandos contraditórios;
  4. acesso remoto a documentos e dados de treinamento dos sistemas de IA de alto risco; e
  5. princípios e diretrizes para orientar a troca de informações entre as autoridades do SIA (i.e., confidencialidade de dados sensíveis, integridade e segurança dos dados acessados, transparência etc.).

Outra alteração importante sugerida pelo CADE é a criação de um sandbox regulatório, que seria um ambiente regulatório experimental e controlado para testar e monitorar o impacto competitivo dos algoritmos, com aplicação de regras distintas para empresas de diferentes portes e domínios.

Com isso, os agentes econômicos poderiam ambientar-se à carga regulatória, com incentivos à concorrência e à inovação no uso da inteligência artificial. Isso porque, na visão do CADE, há um risco crítico de que a elevação de custos regulatórios aumente as barreiras à entrada, impedindo o desenvolvimento de novas tecnologias, em especial para MEs, EPPs e startups.

Nesse ponto, o CADE pondera que o Digital Markets Act (DMA), iniciativa regulatória da União Europeia, assim como outras propostas de regulação de plataformas digitais em discussão ao redor do mundo, tem optado por abordagens de enforcement de regulação assimétricas, concentradas em poucos players que comandam ecossistemas grandes – os gatekeepers (Meta, Microsoft, Amazon, Apple etc.). Essa é o modelo de regulação defendido pelo CADE, conforme nosso último post sobre o tema.

As recomendações do CADE dialogam e complementam o substitutivo inicialmente sugerido pelo senador Eduardo Gomes, que previa nos incisos VI e VII do artigo 41 competência (i) regulatório-sancionatória do SIA para o desenvolvimento ou implementação do uso de sistemas de inteligência artificial para atividades econômicas (o que inclui a classificação dos sistemas de inteligência artificial de alto risco, nos termos dos artigos 15 e 16), além de (ii) atribuição fiscalizatória para sandbox.

A votação do PL pela Comissão Temporária sobre Inteligência Artificial (CTIA), inicialmente prevista para quarta-feira da semana passada (12/06), foi adiada após discussões no plenário do senado (11). Na terça-feira desta semana (18) foi apresentado novo relatório com segunda proposta de substitutivo pelo relator Eduardo Gomes, acatando 27 das 55 emendas apresentadas até a leitura do parecer, além de contribuições de outros nove projetos de lei que tramitavam em conjunto com o PL.

O novo relatório apresentado acolheu as principais contribuições do CADE ao prever:

  • investigações conjuntas entre as autoridades setoriais sobre os sistemas de alto riscos que possam violar disposições do PL ou legislação setorial (artigo 48, § 2º do novo relatório);
  • o dever de órgãos e entidades integrantes do SIA comunicarem ao CADE informações obtidas durante a fiscalização que possam ser de interesse para a aplicação da Lei Federal nº 12.529/2011 (art. 48, § 3º);
  • competência do CADE para ordenar aos desenvolvedores o acesso aos dados de treino, validação e teste utilizados para o desenvolvimento dos sistemas de IA de alto risco (art. 48, § 4º); e
  • regulação assimétrica para incentivar o desenvolvimento tecnológico por microempresas, empresas de pequeno porte e startups (art. 66).

A votação do PL, por outro lado, demorará para ser retomada: nesta terça-feira (18), a CTIA adiou novamente o julgamento do projeto, e aprovou um requerimento apresentado pelo senador Marcos Ponte (PL-SP) para que ocorram mais cinco audiências públicas para instruir a discussão em diversas frentes: avaliação de riscos, governança, autorregulação e boas práticas, fiscalização e inovação sustentável.

O CGM segue acompanhando as novas discussões desse projeto e seus desdobramentos práticos.

Este boletim tem propósito meramente informativo e não deve ser considerado a fim de se obter aconselhamento jurídico sobre qualquer um dos temas aqui tratados. Para informações adicionais, contate os líderes do time de Direito Antitruste, Administrativo e Anticorrupção.

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