
Pílulas CGM de M&A: Não Concorrência e Não Aliciamento
Por Camila Magami Cardinale, Fernando Pacheco Di Francesco e Eduarda Saldanha.
Na pílula anterior, abordamos sobre os chamados efeitos adversos relevantes em transações de M&A. Passamos a cuidar, agora, dos mecanismos de não concorrência e não aliciamento, os quais desempenham papéis cruciais na preservação dos interesses do comprador.
Ao adquirir uma empresa, o comprador está usualmente pagando não apenas pelos ativos tangíveis, mas também pelos ativos intangíveis, que podem incluir, por exemplo, carteira de clientes, know-how, reputação no mercado, relações estratégicas, tecnologia e a própria equipe responsável pelo desenvolvimento dos negócios da empresa. De pouco adianta um comprador realizar investimento significativo para adquirir uma empresa e, algum tempo depois, o vendedor poder abrir um negócio similar, utilizando parte ou totalidade desses ativos intangíveis para concorrer com as atividades da empresa adquirida. Desta forma, as cláusulas de não concorrência e não aliciamento entram em cena justamente para evitar que o vendedor possa utilizar esses elementos para concorrer, indevidamente, com as atividades desenvolvidas pela empresa.
A cláusula de não concorrência (non-compete) representa o compromisso do vendedor de, por um prazo previamente estabelecido, não exercer atividades que concorram, direta ou indiretamente, com o negócio da empresa adquirida. Para ser válida e eficaz, essa limitação deve ser calibrada em três frentes: (i) material, especificando os produtos, serviços ou segmentos abrangidos; (ii) temporal, com prazo razoável e justificado; e (iii) territorial, definindo a área geográfica em que a restrição se aplicará. A depender da transação em análise, a finalidade desse mecanismo pode ser ou não para impedir que o vendedor atue profissionalmente, ou tão somente para evitar que o vendedor utilize seu know-how e rede de contatos para estruturar, logo após a venda, um negócio concorrente capaz de reduzir o valor do investimento realizado pelo comprador.
A cláusula de não aliciamento (non-solicitation), por sua vez, tem como finalidade preservar o capital humano e os relacionamentos estratégicos que sustentam a sociedade adquirida. O objetivo dessa cláusula é proibir por um período determinado – usualmente alinhado ao prazo da não concorrência – que o vendedor tente atrair ou contratar para si, de forma direta ou indireta, clientes, fornecedores, ou empregados-chave da sociedade vendida. A restrição pode abranger desde a oferta de uma posição para um colaborador estratégico, até tentativas de persuadir um fornecedor exclusivo ou cliente importante a mudar de parceiro comercial. Essa proteção é muito importante em setores em que a perda de profissionais ou contratos pode comprometer a operação e reduzir a rentabilidade do negócio.
Na prática, o não aliciamento complementa a não concorrência, criando uma barreira dupla contra riscos pós-fechamento. No entanto, para que essas cláusulas sejam legítimas e eficazes, é fundamental que sejam equilibradas e bem redigidas. Para evitar que esses mecanismos possam ser eventualmente questionados, por exemplo, em razão de proibições desproporcionais ou abusivas, deve-se levar em consideração elementos como (i) natureza do negócio, (ii) valor investido pelo comprador e delimitação da contraprestação econômica, (iii) tempo necessário para o comprador “absorver” os chamados ativos intangíveis, (iv) funções desempenhadas pelo vendedor e momento de seu efetivo desligamento, (v) padrões de mercado, (vi) jurisprudência, entre outros.
Vale acrescentar, ainda, que cláusulas de não concorrência e não aliciamento costumam prever penalidades contratuais para o caso de violação, sendo a multa contratual uma das mais utilizadas. Esse valor deve ser cuidadosamente calibrado: por um lado, precisa ser suficientemente expressivo para desestimular o descumprimento e proteger o valor do negócio adquirido; por outro, deve ser compatível com a realidade econômica das partes, de modo a permitir sua efetiva execução em caso de inadimplemento. Além disso, a fixação de uma multa em patamar muito baixo pode acabar funcionando, na prática, como um incentivo indireto à concorrência, se o vendedor entender que os ganhos com a nova atividade superariam o custo da penalidade prevista.
Em síntese, trata-se de importantes instrumentos para garantir um período de estabilidade pós-transação, protegendo o investimento, evitando litígios e permitindo que o negócio adquirido se consolide. Quando redigidas de forma estratégica, equilibram proteção e liberdade econômica, beneficiando ambas as partes.
Na próxima pílula, falaremos sobre a etapa de fechamento nas operações de M&A — o momento em que o que foi acordado no contrato se transforma em realidade e o negócio muda oficialmente de mãos.
Este boletim tem propósito meramente informativo e não deve ser considerado a fim de se obter aconselhamento jurídico sobre qualquer um dos temas aqui tratados. Para informações adicionais, contate os líderes do Time de Fusões e Aquisições. CGM Advogados. Todos os direitos reservados.

